terça-feira, 30 de dezembro de 2014

O melhor de 2014 (versão ligeiramente estendida)

Praticamente não fomos ao cinema - em claro detrimento do teatro, este ano foi assim. O Hugo conseguiu eleger Gone Girl como o seu filme do ano, eu fico-me pelo maravilhoso Oro di Napoli que vimos apresentado pelo maravilhoso Wes Anderson. Estou cada vez mais chata com filmes, é preciso que tragam qualquer coisa de novo e quase nenhum traz. Sim, agora meto aquela frase que ninguém ousa dizer com medo de parecer nariz empinado: praticamente já só vejo europeus.

Melhor livro é O Pintassilgo, de longe. O Hugo está com os livros como eu estou com os filmes e abstém-se.

Melhor peça de teatro foi Bovary, embora Fausta me tenha mantido hipnotizada por quase duas horas no texto (adoraria conhecer a autora!), disse-me tanto, aquilo. Fomos ao teatro em média duas vezes por mês (Cartão Maria & Luiz, gente! Melhor do que o do Continente) e muito poderia falar aqui sobre a maioria delas, mas retenham-se nas duas ali de cima, caso haja reposições).

O concerto do ano, para o Hugo, foi Jay Jay Johanssen no Mexefest, e eu entendo perfeitamente: o homem estava alegre em palco, muito, mas mesmo muito alegre. A Casa do Alentejo é uma sala muito bonita. Aliás, não volto a perder um Mexefest, não pela música, mas porque as salas são do mais bem escolhido que já vi na vida. O Hugo ouve, eu percorro os cantos a fotografar.

Mas, para mim, o concerto do ano foi Sam Smith no Alive. Que surpresa extraordinária. O vinho branco fresquinho em quantidades generosas pode ter ajudado qualquer coisinha, mas não muito, não tudo.

Melhor série: há unanimidade: The Knick, especialmente a explosão que é o ep. 7.

Melhor cemitério: o dos Ingleses, na Estrela, para o Hugo. O meu continua a ser o dos Prazeres, será para sempre.

Melhor com o Gabriel: acho que ele está entre A Montanha e o ciclo Mais Novos do São Luiz, do qual só apanhei o do Noiserv e foi tão, mas tão bom! Espero que haja mais Mais Novos em 2015.

E pronto, foi este o ano na rubrica Consumo. Que 2015 traga mais e melhor! (Especialmente nos filmes).




Inspiração


Se o que nos consome fosse apenas fome
Cantaria o pão
Como o que sugere a fome
Para quem come
Como o que sugere a fala
Para quem cala
Como que sugere a tinta
Para quem pinta
Como que sugere a cama
Para quem ama
Palavra quando acesa
Não queima em vão
Deixa uma beleza posta em seu carvão
E se não lhe atinge como uma espada
Peço não me condene oh minha amada
Pois as palavras foram pra ti amada
Pra ti amada
Oh! pra ti amada

domingo, 28 de dezembro de 2014

Sou dessas, graças a Deus

Janeiro é excitante com o seu sem-número de possibilidades. Limpa-se tudo, somos tabula rasa, escolhamos as peças que queremos que nos componha. Façamos pesquisas na net, compremos caderninhos novos, tentemos novos métodos, novas abordagens. Queimemos os últimos cartuchos do nosso former self entre o 26 e o 31, aquelas coisas que detestamos e que nos confundem. Janeiro é balde de água com sabão, rodo, pano de chão. Nada é impossível para janeiro, o mês das causas impossíveis, o mês com superpoderes.

E em setembro há outra hipótese.

O declutter que não me é natural - e é mais do que urgente*

Tempo nas redes sociais.
Comida má.
Merdas que não dependem de mim.

*Chamemos-lhe "resoluções para janeiro".

E mais isto, roubado do perfil do FB da C:

" If I give myself a few moments of stillness and emptiness before I must make a choice or a decision, I will find wisdom. If I do the same before I contemplate a rose, eat a meal, hear a concert, listen to a friend, my perceptions will be clearer and richer.
Stillness and emptiness prepare and weave the context for wisdom, for meaning, for goodness, for aliveness, for creativity. They form the manger of my soul.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Self surrender 2014*

O mundo não gira em torno do meu umbigo e eu não tenho o Anel que rules them all;
que esta noção torne o meu 2015 mais leve de culpas. 


*Adoro roubar termos de livros.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Uma birra curtíssima

Foda-se, porque diabo não posso estar depressiva no Natal? Estou perfeitamente funcional o ano inteiro, a true provider de amor, comida, calor, dinheiro, tempo. Funciono muito bem dentro das minhas limitações todos os dias do ano, menos no Natal.

Para o ano, o meu desejo de Natal é ser deixada em paz. Não exijam rigorosamente nada de mim entre o dia 23 e 25. Podem exigir antes, que adoro ver as luzes e comer fritos. Mas quando bate aquela solidão sem fim nem meio, aquela sensação de que nada vale a pena e de que não há amor neste mundo que me compense por tudo que se vai perdendo pelo caminho, quero ser deixada em paz.

Talvez um abracinho, vá. 

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

O que queres de Natal, Melissa?

Criar calo, meu senhor! Criar um calo bem rijo nas partes que ainda estão moles e já não deviam estar.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Dezembro

"Stress puro. Temos de aprender a acalmar e relativizar."

Foi com este SMS que a Casaca respondeu a uma série de queixumes meus. A minha saúde anda uma merda, num mês fui parar três vezes às urgências, em duas delas tive de voltar para um upgrade de drogas porque o tratamento inicialmente receitado não tinha sido suficiente. E isso deixa-me péssima, porque eu não sou assim - sou uma gaja de alergias, não de maleitas.

Acontece no Natal. Normal, não é? É no fim do ano que fazemos contas à vida, e, no caso dos culpossauros, o saldo raramente é satisfatório. E o ano nem sequer foi mau, muitíssimo pelo contrário: profissionalmente foi o melhor de sempre. Tive uma viagem fantástica a Paris e outra ao Alentejo que me deixaram felicíssima. Não discuti com ninguém. Não houve crises. Não perdi amigos. Fora estes piripaques de fim de época, estivemos todos sempre saudáveis. Ouvi a melhor coisa que uma pessoa pode ouvir na sua vida (acham que é "eu amo-te"? Não, senhores. É "é benigno".) Foi um ano muito bom.

Mas dezembro é cansaço, cobranças, tristezas muitas. Vêm-me umas teimosas saudades da minha mãe. Uma nostalgia brutal de coisas que nunca cheguei a ter. Enfim, em dezembro chove merda, e mais triste é a chuva de merda este ano com um filho apaixonado por presépios e histórias do Novo Testamento (esta parte está bem coberta; ter estudado boa parte da vida com padres deixou um bom legado de conhecimentos de mitologia cristã, Deus seja louvado).

Mas chove merda, e estou dorida, magoada. E li o SMS da Casaca no carro, e caramba, estava sol lá fora e o carro parecia um ovo quentinho, e eu pensei, foda-se, queria que fosse MESMO um ovo. Queria encolher-me numa bola à espera de janeiro ou de fevereiro ou sei lá de quando. E está tão quentinho aqui dentro e está a tocar uma canção linda, vou ficar. Vou ficar.



Agora finalizava com um "e ficou tudo bem...", mas não, só ficou bem durante cinco ou seis minutos.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Relaxar

E no dia de Natal parto para o Alentejo com os meus, para passar quatro dias nas lezírias, a contemplar o nada, em meditação, a recarregar a alma, perder a noção do tempo.

Quem é que estou a enganar? Como já disse antes, eu não relaxo no vazio; em repouso, a minha cabeça aborrece-se, e não descansa. O meu repouso é a beleza, é o movimento, é a ideia nova, é o novo ângulo, aquele pormenor que nunca tinha visto nem considerado. O meu descanso é justamente o estímulo, o meu silêncio é o barulho selecionado. Ontem a minha ave preferida falava em coisas que a descentram e que exigem empenho, e senti que não tinha isso. Hoje acordei a sentir o contrário - eu tenho sim, o meu zen - só é um pouco diferente do zen como ele é habitualmente percebido.

E vou sim, para o Alentejo, só não para o meio do mato. Vou para onde haja muitos cemitérios, igrejas e túmulos para escarafunchar.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Disse-me um sábio durante uma crise de insegurança:

 A insegurança, a sensação de ser uma fraude e o medo de fazer errado são vivências exclusivas das pessoas competentes. 

Os incompetentes são imbecis dotados de certezas absolutas que se acham perfeitos e insubstituíveis. Talvez sofram menos, mas eu não gostaria de ser um deles. Prefiro sofrer mais. Vá em frente e acredite no seu trabalho. 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Do Facebook da Ju, hoje

Um ano de saudade profunda e absoluta.
O QUE EU APRENDI COM A CECÍLIA
Aprendi que o ser humano é bom, que amor ao próximo existe e que as pessoas ajudam pelo simples fato de ajudar. E num momento de fraqueza e desespero, se sentir amado renova forças e nos ajuda olhar pra frente e continuar lutando.
Que a vida é pra ser vivida! Apesar das derrotas, apesar das tristezas, apesar das doenças, ela é um presente e temos que aproveitá-la.
Que podemos sempre ver a situação pelo lado bom, por mais cruel que se mostre a realidade. Um dia, Cecília já bem judiada pela doença e pelo tratamento, com a pele vermelhe e sensível, se olhou no espelho, sorriu e disse: É bom que eu nem preciso de blush, né, mãe?! Minha bochecha já está vermelhinha.
Que a amizade é uma dádiva divina. Que podemos ter amigos eternos, verdadeiros, prontos pra demonstrar a profundidade de sua amizade. E que ela pode nascer, linda, alicerçada em momentos de provação.
Que as vezes precisamos levar um tapa da vida para nos tornarmos pessoas melhores. Rever valores, conceitos, necessidades e aprender que o melhor da vida é a simplicidade e não precisamos mais que isso para sermos realmente felizes.
Escrevo esse texto porque dentre tantos ensinamentos que minha Joaninha deixou, alguns foram fundamentais para explicar sua breve passagem por esse mundo material e consolar meu coração sangrante de mãe.

Que a vida te sorria em vários tons de lilás todos os dias, minha amiga. 

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Coisas bonitas que não me saem da cabeça (graças a Deus)



"Montezuma"

So now I am older than my mother and father
when they had their daughter
now what does that say about me

Oh how could I dream of such a selfless and true love
could I wash my hands of
just looking out for me

Oh man what I used to be
Oh man oh my oh me
Oh man what I used to be
Oh man oh my oh me

In dearth or in excess 
both the slave and the empress
will return to the dirt I guess, naked as when they came

I wonder if I'll see any faces above me
or just cracks in the ceiling
nobody else to blame

Oh man what I used to be
Oh man oh my oh me
Oh man that I used to be
Oh man oh my oh me

Gold teeth and gold jewelry
every piece of your dowry
throw them into the tomb with me
bury them with my name

Unless I have someday
Ran my wandering mind away

Oh man what I used to be
Montezuma to Tripoli
Oh man oh my oh me

Sim, morte, maturidade, etc. etc., Melissa a ser Melissa. 

sábado, 6 de dezembro de 2014

Das noites perfeitas

No Campo das Cebolas, com o Gabriel a correr à nossa frente, disse-me o Hugo: não há nada que eu goste mais do que passear em Lisboa contigo. Sorri. Não há nada que eu goste mais do que passear em Paris com ele, seguido de em Roma com ele, seguido de em Praga com ele. Mas Lisboa enche-me as medidas também. E andar devagarinho à noite, a olhar para dentro dos restaurantes fashion e bares, ver os pormenores das portas das igrejas sem pressa, os artistas de rua (cada vez há mais, benzadeus), os navios, os tuk tuks... Sabe a novidade, e eu relaxo na novidade, no barulho (assunto para outro post).

Estavam nove graus mas não os sentíamos, por algum motivo. Fomos ver a árvore do Terreiro do Paço, que deslumbrou o Gabriel. Bebi ginginha, que o Hugo acha brega a menos que seja no Rossio. Fomos ver o estúdio do Toca a Todos, demos dinheiro à Cáritas. Vimos o ensaio do Boss AC. Percorremos as paralelas da Rua Augusta para o Gabriel escolher as melhores luzes (Escolheu as da rua Garrett, super xoxas), apanhámos o atalho do metro para irmos jantar comida dos deuses e surtar com a conta no fim. Fomos à Bertrand Chiado porque é inevitável passar por aquela maravilha às dez da noite e não entrar. Saímos de lá com dois livros para o Gabriel e uma BD para mim, coisa obscura nacional que já me rendeu duas boas ideias para o filme.

Ir andando devagar, apanhar o concerto do Boss AC - é sexta-feira, yeah! -, castanhas para o meu filho de barriga rota. Fotografar os pormenores da Nossa Senhora da Conceição enquanto o Gabriel bebe água sentadinho num degrau. Adormeceu antes de o carro chegar ao Cais do Sodré. Perdemo-nos. Chegámos a casa tarde, muito tarde, já com muito frio, já a espirrar.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Duetos e a ranzinza do sofá

Não sou daquelas pessoas que resmungam das coisas novas, "comerciais", que hoje tudo é mau e feito às pressas. Pelo contrário, sinto-me jovem, gosto das tendências, das novidades, das reciclagens e essas coisas todas. Mas ontem apanhei-me num momento rezingão, ao ouvir o meu dueto preferido da época, que está ali por baixo. Não conhecia a letra, então fui ler: caramba, tão sóbria, contida, económica. E explosiva de amor ao mesmo tempo. Adulta, madura. Raio da música é velhíssima, tem 70 anos.

Então fui ouvir o meu dueto preferido sem ser da época, fofo todos os dias:

E fiquei irritada. Caramba, já não há músicas sóbrias, adultas e incrivelmente românticas, ou sou eu que ando a procurar nos sítios errados? Há uns anos, li uma crítica ao maravilhoso O sítio das coisas selvagens (filme, não livro), em que o crítico também padecia da mesma irritação com a música/cinema ditos independentes: mas será que agora temos todos de permanecer numa eterna adolescência, a sermos fofinhos, a encarar os nossos trauminhas de infância e a sermos mais fofinhos ainda na nossa fragilidade? Já não podemos dar uma de Hemingway e meter tudo para dentro e sermos machos, de vez em quando?

Não me entendam mal: acho uma lufada de ar fresco o podermos ser jovens e imaturos e coloridos e fofos, mas já é uma lufada a dar para o longuinha. Ao ler a letra do Frank Loesser (seja quem for) senti a permissão de ser adulta, sem macacadas nem fofices. Uma lufada de ar gelado que apreciei bastante. 

Fui reclamar dessas coisas todas ao Hugo, que estava deitado no sofá. Pus as pernas dele em cima das minhas e pus-me a falar e a falar. Ele não concordou com nada. Deve ser porque curte Nick Cave.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

I don't "like" things, I obcess

Igreja de São Luís dos Franceses: não só nunca tinha lá estado como nunca tinha dado por ela, mini mini, super discreta e ainda francesa after all these years. Fomos ver um coro africano, lindo, e decidimos ficar para ver o concerto a seguir simplesmente porque estávamos na primeira fila e seria muito difícil passar pelo monte de gente até chegar à porta. Não conhecíamos a cantora, mas sem problemas, porque estava quentinho, estávamos sentados. E que bom que ficámos, que bom golpe de sorte tivemos em ter lá ficado. A música era mágica, fantasmagórica. A cantora, misteriosa e linda. Houve uma canção em que fechei os olhos e vi o Oscarizável a desenrolar-se à minha frente. O Hugo deu-me uma cotovelada, julgou que eu tivesse adormecido.

Mas não é pela Johanna Glaza que fiquei obcecada, não senhores. Ora bem, se repararem, não descrevi minimamente a igreja de São Luís dos Franceses, além de dizer que era pequena. Isso porque não reparei mesmo nos pormenores. E não reparei nos pormenores porque, diabo, sentei-me em frente a isto.

Ora bem, primeiro li, fiz umas contas de cabeça. Casou aos 18, morreu aos 31. Tudo bem. O viúvo encomendou a placa informativa (na falta de termo melhor: de certeza que existe).
Cinco minutos depois, ainda durante o coro africano, já me perguntava de que teria morrido a Condessa de Chambors. Porra, 31 anos é novo até para a altura. A placa não fala de filhos. Cotovelada do Hugo, ouve a música.
Dez minutos depois, já procurava o túmulo da Condessa debaixo do meu banco, pois os bancos ficam por cima dos túmulos. Nada, são ilegíveis. 
Quinze minutos depois, googlava discretamente o nome gigantesco da condessa. Nenhum resultado, vou voltar a tentar agora.

No fim de tudo, já andava à procura no placard da igreja com quem é que podia falar sobre a Condessa. Também não encontrei. Desespero por um dia de folga durante a semana para ir falar com o padre ou algum sacristão ou o que valha. Preciso de saber de que morreu a Condessa, tão nova. 

Preciso, a sério.  

Update quase imediato: encontrei isto, mas ainda não sei de que morreu a senhora.