sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Empatia

Contares-lhe que tiveste um sonho pavoroso, dizeres umas três ou quatro frases sobre o sonho e ouvires um "isso é horrível" em vez de "foi só um sonho". Fiquei-lhe tão grata. Ele acha que me conquista com elogios e piadolas, mas não - não sempre, não de repente. Conquista-me, sim, com a sua enorme bondade, que ainda me surpreende nos momentos mais pequeninos.

(Os meus piores sonhos não são aqueles em que ele ou o Gabriel morrem. Nesses, eu acordo assustada, vejo que foi um sonho e sigo a minha vida. Os meus piores sonhos são com o regresso da minha mãe depois destes anos todos. Tenho um repertório completo de variações dessa história: ela abandonou-nos por outra pessoa; nós a abandonámos. Já não a conheço porque se passaram tantos anos. Já não temos assunto. Atiro-lhe coisas para a cara. Sou má para ela. Sabem aqueles sonhos dos mortos num lugar bonito, onde os abraçamos e somos felizes? Nunca os tive. Os meus são sempre de uma crueldade milimetricamente composta, obras-primas de coerência, nenhuma quebra de raccord.)

1 comentário:

Livia disse...

Não consegui lhe ver no ano passado quando estivemos em Lisboa, mas continuo com seu blog entre os meus "favoritos" porque adoro seus escritos. Eles me emocionam. Um grande beijo e Feliz Ano Novo! Livia Rodrigues