quarta-feira, 23 de maio de 2012

Falámos sobre Kevin (COM SPOILERS)

A Eliana, a amiga sempre acelerada que fiz no último curso de guionismo, foi ao cinema e depois tivemos esta conversa.
    • Oi Melissa, ontem fui ver Temos que falar sobre Kevin.
  • há 2 horas
    Melissa
    • e então, que achaste?
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • TERROR
    • Gostei do final "feliz"
  • há 2 horas
    Melissa
    • achaste o final feliz?
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Não captei a mensagem do narcisimo, não sei o que estavam querendo dizer com aquilo.
  • há 2 horas
    Melissa
    • eu achei tristíssimo, aquela mulher presa àquilo para sempre
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Sim, mas isto temos desde o princípio... mas o olhar do filho-demo na última cena é difernete
    • tem humanidade, e ele começa a ter dúvidas, o que é humano.
  • há 2 horas
    Melissa
    • sim, ele está apavorado
    • mas n acho que sejam dúvidas, é só medo pela integridade física, achei eu
    • ele não considerou que n ficaria numa juvie para sempre, foi erro de cálculo
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Não, a
    • Não, tem um diálogo que, pareceu-me, está ali para clarificar que a questão não é o medo da prisão dos adultos, porque a mãe diz qualquer coisa como "calculaste bem, cometeste o crime antes dos 16, cheio de prozac, sabes que com isso terás condicional em poucos anos"
  • há 2 horas
    Melissa
    • isso eu acho que é a mãe que já sabe tudo
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Eu acho que o olhar é de dúvida mesmo, será que eu fiz merda, e é por isso que a mãe o abraça. POr isso que eu achei "feliz"- dentro do contexto.
  • há 2 horas
    Melissa
    • e ele até pensou nisso, mas bateu o medinho
    • haha és uma otimista
  • há 2 horas
    Melissa
    • eu acho que era só medo do enrabanço inevitável. Ou então sim, o prozac a falar
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Epá, esse filme inaugura o gênero "terror psicológico para mães".
    • Acho que nenhum homem écapaz de sentir o que a gente sente vendo isso.
  • há 2 horas
    Melissa
    • sim, é um filme sobre mães
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Mil vezes pior que o bebê de rosemary.
  • há 2 horas
    Melissa
    • beeem pior
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Mas e a cena do narcisismo, vocÊ captou? eu não captei a mensagem...
  • há 2 horas
    Melissa
    • de quem, do Kevin?
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Dos dois, sei lá.
  • há 2 horas
    Melissa
    • eu n vi narcisismo nenhum
    • vi uma tipa que idealizou a maternidade, aquilo correu mal
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Porraaannnn... pelo menos eu vi. Mas não entendi.
    • Ferida narcísica, pois, mas e daí?
  • há 2 horas
    Melissa
    • do Kevin, acho tudo muito aleatório desde sempre até ao fim, olhar incluído
    • mesmo que o filme tente mostrar que a mãe não criou laços com o filho e blablabla
    • pobre mãe
    • vou escrever à autora do livro, isso não se faz
    • (mas eu não chafurdo filmes como tu, fico mais cá em cima :D)
    • o Kevin é um psicopata e a mãe acha que a culpa é dela
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Eu acho que o buraco é mais embaixo, a parada do narcisismo é a seguinte: eles são extremamente parecidos (corte de cabelo idêntico, fisionomia, tipo físico), tem aquela cena do rosto a mergulhar na água que aparece no início e repete quase no fim do filme (narciso a se olhar no lago), e na última cena, quando finalmente o olhar dele muda, eles estão diferentes: a mãe de cabelo comprido e ele de cabelo rapado. Tem alguma teoria aí que eu não consegui captar, mas acho que envolve os dois. Não entendi direito. No caso dele acho que rolou um super édipo também.
  • há 2 horas
    Melissa
    • ena não tinha visto nada disso, só que eram super parecidos, siga
    • isso sim, é final feliz para mim
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • Isso o quê?
  • há 2 horas
    Melissa
    • o cabelo diferente no fim do filme
    • aí pode haver alguma esperança
    • o que captei foi
    • ele quando teve medo, quando falou do medo, a mãe disse-lhe exatamente como ele tinha planeado tudo
    • sem pinga de emoção
    • mas o que achei foi que ela tinha acatado o destino de ser mãe de um monstro e pronto
    • já nada a poderia comover
  • há 2 horas
    Eliana Sá
    • A não ser a dúvida do filho, pela primeira vez.
    • Um lampejo de humanidade, por menor que fosse, a comoveu.
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • achas que ela balançou?
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Sim, ela abraçou o mostro!
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • ihh, não acho nada
    • porque a culpa é dela
    • fez-lhe o quarto todo direitinho, abraça-o, visita-o
    • porque a culpa é dela
    • foi ela que o fez à imagem e semelhança
    • acho que o abraço e o quarto são iguais aos murros que aceita na rua
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Sim, queremos que nossos filhos sejam uma versão melhor de nós e ele foi o lado meio egocêntrico dela elevado à milionésima potência. Que pesadelo. Ninguém merece, a não ser os verdadeiros psicopatas. O que ela estava longe, muito longe de ser.
    • Eu acho que aparada do narcisismo é isso aí, Melissa.
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • tenho de ler o livro a ver se é tão duro com ela
    • sim, sim, n tinha elaborado
    • TEMOS DE IR MAIS AO CINEMA JUNTAS
    • adoro o teu chafurdanço
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Da parte dela. Da parte dele tem a ver com o édipo, identificação tão grande com a mãe, cimúme tão grande do mundo que ele tem que destruir o mundo para ter atenção da mãe só para ele. Menino que se porta mal para chamar a atenção da mãe em escala de terror. Cara, mães que têm filhos mal-comportados NÃO podem ver este filme.
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Ahahahaha chafurdanço...
    • Olhando de fora, eu acho ela pouco culpada disso tudo, mas percebo a mega culpa dela que o filme transmite o tempo todo.
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • a minha cena é se essa culpa vem toda dela ou temos dedo da dona autora ali também
    • da autora não, da realizadora, pq sei que a autora do livro puxa muito mais pelo amor do que o filme
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Se a autora é mãe, ela tem culpa. Ponto. Ser mãe é sentir culpa.
    • Ela ama o monstro. Eu tinha mandado ele para o reformatótio depois do assassinato doporquinho da índia, nem mais.´
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • achas?
    • eu acho que quando ela o atira contra a parede, selou o seu destino
    • vou cuidar dele para sempre
    • não acho que seja amor, acho que é expiação pura
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Pode ser... mas ela só o abraça na na final, antes ela só vai à`prisão para "cumprir tabela" (Não sei se vocÊ conhece esta expressão)
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • (e ele não quebra, né? ela tentou quebrá-lo e ele não quebrou, é indestrutível e ela viu isso naquele momento, nem valia a pena)
    • só se o abraço
    • eh pá, não acho que foi mecânico, mas e daí se ela tinha o cabeço comprido e ficou horrorizada com o que lhe disse o colega de trabalho, talvez já esteja farta daquilo e seja um abraço de despedida
    • deixa o quarto todo pronto para ele e baza
    • amor é que não, não vejo ali amor nenhum
    • só na gravidez
    • e aí é uma coisa narcísica, mesmo
    • a primeira imagem dela com o bebé é forçando um sorriso
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • MAs ela se empenhou em criar laços mas deu azar, o moleque era caso perdido. Em algum momento ela passa a amar ele, lá do jeito dela. Eu acho que ela não criou laços de partida, mas depois o amor apareceu. MAs era semente em terra árida.
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • vou ver outra vez daqui a uns tempos a ver se me convencem (todas as mulheres com quem falei viram esse amor. Os homens, nem por isso)
    • bem, dona, vou trabalhar!
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Sim, vamos. E eu nunca mais vou ver esse filme, com certeza!
  • há cerca de uma hora
    Melissa
    • boa conversinha astral para começar o dia!
  • há cerca de uma hora
    Eliana Sá
    • Ahahahah bom dia!
  • há 6 minutos
    Melissa
    • Eliana, posso guardar esta conversa no meu blog? tiro o teu nome, obóvio
    • não tinha dito nada sobre o filme e está cá tudo, tirando o trabalho
    • Ponho só "a amiga chafurdadeira que gosta de analisar filmes" ou outro nome artístico da tua preferência, se n te importares, claro
  • Eliana Sá
    • Pode pôr sim e põe mais uma coisa, que eu achei fantástica, acho que foi a melhor cena do filme: a mãe vendo ele na TV, o moleque sendo entrevistado na prisão pagando geral que as pessoas só vêm TV, que inclusive a coisa tinha chegado ao ponto ridículo da TV mostrar pessoas vendo TV, e que o que as pessoas queriam ver era gente como ele. Que se ele tivesse tirado 20 em geometria, já tinham mudado de canal. E eu ali no cinema vendo aquilo, e pensando: estou vendo gente vendo TV, estou vendo um psicopata, o que eu estou fazendo aqui neste cinema, eu quero ir para casa estar com meus filhos. Ser mãe é sentir culpa. Põe meu nome, acho que não tem mal. Assim espero. Vou almoçar, tchau!
  • há cerca de um minuto
    Melissa
    • hahhah




9 comentários:

Ana C. disse...

E eu que achei só seca?

Pekala disse...

vocês não perceberam nada!!!!!!!
LEIAM O LIVRO!

p.s. a palavra chave é "redenção".

gralha disse...

Acabei de ver e estou cilindrada. Cilindrada. Vai perseguir-me nos próximos dias. Como é que achaste seca, Cê?

(E não acho nada que a dúvida do fim = final feliz. É resignação da mãe e miaúfa do filho)

Melissa disse...

Pekalita, o filme é um objeto independente, é uma leitura do livro, não tem de ser la meme chose. Eu adorei a leitura da realizadora. Tenho algumas dúvidas, mas adorei.

Ana C. disse...

É um filme maçon. Tens que identificar a simbologia implicita, as pistas escondidas. É um trabalho árduo para caraças.
Pekala, eu tenho a certeza que em livro é diferente, pois estás a acompanhar a cabeça da Tilda por dentro e não por fora ;) O cinema é tudo o que as imagens te podem contar. Um livro é outra cena...
Ela redime-se através da sua vida de merda, depois do crime do filho, ela esfrega a tinta, ela aceita estalos, ela aceita tudo, pois acha que merece. Once again: SECA.

Melissa disse...

Cê, nunca te vi tão alterada por um filme! Não gostaste, pronto, mas reduzir o filme a um desfilar de clichés acho meio exagerado. O filme não é simplista, tu é que não gostaste, é diferente.

Tem muitas camadas, sim, mas não acho nada hermético, afinal é tudo do domínio da maternidade, essa coisa que conhecemos tão bem. Claro que se formos a Eliana (adoraria ser assim), mergulhas no filme e lá chafurdas. Eu sempre que acho que vi muitas camadas, aparece alguém que viu outras e mais, tão bom.

Independentemente do género, é o que mais gosto em qualquer obra de arte: que dê matéria para uma boa dose de masturbação mental.

(Mas não dispenso cineminha para divertir também, óbvio)

Ana C. disse...

Eu fico alterada com as alterações que provoca o filme. Demasiada masturbação para a minha forma de ser. "Apenas" isso.

triss disse...

Não li o post nem os comentários, vou a correr ver o filme e já cá venho meter achas na fogueira.

triss disse...

Ainda não escrevi o postzinho no meu blog, mas queria vir aqui comentar a última cena, da prisão.
Acho que o que o miúdo sente é medo de ir para a prisão a sério, onde vai ser comido vivo. Quanto a humanidade da parte dele não a vi, ou pelo menos não entendi assim. E isto porque ele é doente, sociopata e psicopata, e não me parece que quem padeça disto tenha um momento de lucidez. Porque se tiver, mata-se perante a enormidade do que fez.