quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Chegadas e partidas

Quem é imigrante e tem pai emigrante passa mais tempo em aeroportos do que as pessoas normais. E levamos com as avalanches de emoções dos desencontros e reencontros dos outros o tempo todo, especialmente quando somos especialmente abelhudos, com uma predileção em futricar a vida alheia (como eu).

Nas partidas é segurar o nó na garganta. Abraços longos, mãos no rosto, crianças que mudam de colinho, tens aí tudo, não te esqueces de nada, cartão de embarque, passaporte. Silêncio, choro chorado e choro engolido. O meu é engolido. O meu pai trabalha fora há demasiado tempo para ainda haver drama de aeroporto. Fico-me pelos outros.

Nas chegadas, correrias desvairadas, crianças a driblar seguranças aturdidos e a pendurar-se em pescoços, malas que se soltam, carrinhos de bagagem que se tresmalham. Beijões enormes e melados. Adoro as chegadas. As chegadas são sempre boas, mesmo quando só há alguém com um papelinho e o nosso nome à espera. Mesmo a pessoa do papelinho leva com um sorriso aliviado. Ah, está ali alguém por minha causa.

Na última vez que fui ao aeroporto buscar papai, houve outra chegada. Ela vem com uma mala pequena, vem a arrastar-se, alheia à alegria toda à sua volta. É esperada por duas pessoas muito sérias, um rapaz e uma mulher. A cerca de dez metros de quem a espera, ela apressa o passo. Vai dar um abraço ao rapaz, mas os joelhos falham-lhe enquanto o pranto rebenta, ela cai. Chora como nunca chorou na vida, talvez apenas como tenha chorado quando recebeu a notícia que a põe em Lisboa naquela manhã. O rapaz ajoelha-se também e estão ali naquele abraço doloroso. A mulher tenta fazer algum controlo de danos. As pessoas interrompem a alegria da chegada e olham para aqueles desgraçados. Eu também. Sei bem o que é aquela chegada, bem como muita gente que está à volta. Não passei por ela da mesma forma, mas passei por ela da mesma forma. Há coisas que são estranhamente iguais para todos nós. 

5 comentários:

Naná disse...

Detesto despedidas... mesmo aquelas que são transitórias...

Mas as mais permanentes... essas deixam-me sem palavras e com o mesmo nó na garganta...

Tella disse...

brutal

gralha disse...

Ai, os aeroportos. Demasiado intensos para mim, deixei de os associar a aventuras e passei a ligá-los a separações. Não gosto de aeroportos.

InêsN disse...

tenho saudades dos aeroportos e, infelizmente, a última vez que estive num foi para receber o meu pai vindo de mais um tratamento infrutífero :(

José Lyra disse...

Lindo filha...tem uma musica do Milton q cairia como uma luva no texto...
..a hora da chegada eh tambem despedida...tem gente que vem para ficar...tem gente que vai para nao voltar...