terça-feira, 18 de janeiro de 2011

To mother (um verbo que faz falta)

Em Abril de 2004 a minha mãe terminou a quimioterapia e, contentíssimos, achámos todos que ela estava pronta para voltar à sua vida cá em Portugal. Em Julho do ano anterior tinha sido levada às pressas pelos irmãos para o Brasil, para que pudesse ser tratada lá, dentro do mundo que a conhecia melhor. Foram meses de muito amor, muito mimo. Foi por isso que, em Abril, escrevi uma carta aos meus tios e primos (e pedi-lhe que a imprimisse e lhes oferecesse em meu nome, até hoje não sei se o fez). Não me lembro do que escrevi e nem guardei cópia, mas agradecia-lhes, no fim, com algo como "A todos vocês, fantásticas mães homens e mulheres, obrigada por terem-no sido para a minha".

É o que sinto até hoje: ser mãe também é um papel a desempenhar. Ontem em conversa com a douta amiga Cê sobre o assunto, comecei a dizer o que era, para mim, amor de mãe, e se seria preciso parir para o conhecer. Cheguei a algumas conclusões, no meio da minha própria baboseira, sobre o que penso:
1 - penso que o tal "amor de mãe" tem, sim, uma componente biológica que nos liga à cria e isso torna esse tal "amor" diferente de outros que tenhamos experimentado. No entanto, partilho com a douta amiga Estrela a noção de que é uma faca de dois gumes: não tem de ser necessariamente bom. É um novo tipo de amor, sim, mas também um novo tipo de medo. Ganhamos uma nova fragilidade. Desculpem lá a falta de romantismo da coisa, mas mesmo depois de me rebaixarem de signo continuo a ser Carneiro nas vísceras e no coração.

2 - Repudio genuinamente a noção de que o amor de mãe é que é o amor de verdade. Acho que o amor de verdade é qualquer amor abnegado e generoso: a enfermeira que larga o quentinho de casa e vai para um cenário de catástrofe cuidar de gente podre, morta e sem nada, para mim, ama com abnegação. O amor de verdade é o que transcende o eu pelo próximo no cuidado - revela-se, portanto, na acção. Acrescento ainda que o acho ainda mais formidável sem o tal elo biológico, quando a sua motivação não nasce de um instinto.

3 - Já disse que, para mim, "amor de verdade" é acção? Sendo um "amor de verdade", o "amor de mãe" é acção e aqui volto ao agradecimento que fiz aos meus tios. Amor de mãe é ser mãe. Além de cuidar, cheirar e morder as pessoínhas maravilhosas que escolhemos fazer, podemos ser mãe em pequenas doses diárias todos os dias ou em doses magníficas e gigantescas de abandono de si próprio pelo outro, por quem está mais fraco e precisa de nós.

9 comentários:

gralha disse...

Belo post, Dona Mel, belo post!

InêsN disse...

great!

Pekala disse...

Mel,perfeito!!!!

Ana C. disse...

Ser maternal (no sentido de "cuidar de") com amigos, desconhecidos, família não vem com a maternidade, vem de dentro da pessoa mesmo.
Chiça adorei este post.

Dani disse...

Amei! Parabéns por seres assim...

Precis Almana disse...

Tou contigo no post todo. E com a C. Ser maternal está com a pessoa mesmo.
Mas sabes, eu sinto mesmo um amor diferente de todos pelos meus dois sobrinhos mais próximos. Mas, se pensar bem, sinto um amor diferente por cada pessoa que amo. Com eles sinto é o tal medo. Por eles e por mim, no caso de não poder estar presente quando precisarem.

Anónimo disse...

sem mais... :)

Ananin disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jolie disse...

lindo. e totalmente verdadeiro.