Na minha infância passada na gigantesca casa da minha avó, no fim dos anos 70 e começo dos 80 no Nordeste brasileiro, ouviam-se as empregadas a falar dos filhos que tinham perdido ainda em bebés, por um motivo ou por outro. Filhos e irmãos. A morte das crianças era algo bastante presente na vida delas. Não era presente na nossa vida de classe média, mas era na delas.
A minha mãe trabalhava numa creche para menores carenciados na periferia de Fortaleza. Não se passava uma semana sem que um bebé morresse por desnutrição, tuberculose, pneumonia. Eu não tinha irmãos nessa altura, e apegava-me a esses bebés (mamãe levava-me com ela muitas vezes) para depois saber que tinham morrido. Assim. Eu lembro-me do nome de algumas delas - Frederico, Nonato, "Cuscus", Mariana -. Pergunto-me se alguém, fora as mães, caso sejam vivas, ainda se lembra que eles existiram.
E é por isso que odeio, como já disse aqui antes, quando dizem que Portugal é um país de terceiro mundo. Quero lá saber se é força de expressão, é insultuoso e leviano. Há outros termos mais adequados, de certezinha - não sou eu que vou dizer, até gosto bastante deste país - mas terceiro mundo não é um deles.
4 comentários:
Agora já não se diz terceiro mundo...agora é "países em vias de desenvolvimento" :)
E sim, concordo contigo. Em muitos países ditos desenvolvidos não há sistema de saúde nem licenças de maternidade, por exemplo.
E a mortalidade infantil é um dos índices que melhor espelham a sociedade...No entanto, tal como no Brasil da tua infância, também no Portugal da minha infância morriam muitas crianças, durante a gravidez, durante o parto, no primeiro ano de vida, acidentes infantis, etc...Embora o "povo" goste muito de dizer "antigamente é que era bom".
Bjs
Exactamente. Há muita gente a precisar de viajar - sem ser só a Nova Iorque, Londres, Paris e Milão.
E é bem verdade o que diz a Sofia. As pessoas têm memória muito curta.
É o terceiro mundo do primeiro mundo, mulher!!!
De qualquer forma, acho que adoro as tuas recordações de infância. As boas e as más. Adoro-as.
Tocaram num ponto que já estou para falar há que tempos. Também detesto o "antigamente é que era bom", bem como os textos de "brinquei na lama e levei tautau e cá estou", já agora. Está bem, estão cá muitos, podiam estar muitos outros. Perdi um priminho (afastado) com dois anos de idade porque não era obrigatório o uso de cinto de segurança e ele foi projectado num acidente.
Gosto dos modos de hoje em dia, em que podemos equilibrar o que se sabe de novo com o que de bom traz o passado. Mas "antigamente é que era bom" só vale comparado ao mais antigamente ainda.
Cê... Mesmo como expressão acho detestável e leviano. E gosto que gostes da minha longa vida!
Enviar um comentário