Não me canso de dizer aqui que tive um luto complicadíssimo, cheio de etapas queimadas, uma bola de neve de problemas rolando para baixo fosse Inverno ou Verão.
Hoje, ao deparar-me com um post de um enlutado da blogosfera, tive a noção muito, muito clara de que o meu luto acabou. Não é por ter um ou dois ou três recalcamentos que ainda não aceito a morte da minha mãe: houve coisas que ficaram por dizer e por fazer que agora passam, simplesmente, para o meu legado espiritual e emotivo. Fazem parte da dor e da delícia de eu ser quem eu sou. Mas...
- Já não penso que vou voltar a vê-la, nem neste plano nem noutro qualquer.
- Não sei o que faria se voltasse a vê-la. Neste momento, não sei que papel teria na minha vida.
- Ela não fez uma viagem. Ela deixou mesmo de existir. É ponto assente.
- Conheço bem o que ela deixou de bom e de mau.
- Sei que ninguém teve culpa do que aconteceu, nem Deus, havendo Deus.
Ainda não estou pronta para falar dela ao Gabriel, ainda dói muito. Mas ao contrário do que tem acontecido nos últimos anos, combato a paralisia que essa dor causa. Estou a tentar incorporar essa dor como incorporei tudo o resto. O objetivo aqui é transformar a dona Melânia na protagonista das memórias fixes que o meu irmão e o meu pai têm dela e passar isso ao meu filho, como eu guardo as melhores memórias de uma avó que eu nunca conheci - a mãe do meu pai - porque foi o que me foi passado.
Estou pronta. Estou pronta, agora.
Estou pronta porque descobri que estar pronta não é o mesmo que não sentir dor.
Bola para a frente, porque daqui a dois dias é 26 de Outubro.
5 comentários:
Essa do "deixar de existir" é que me faz muita confusão. Como é que as pessoas que fazem parte da nossa vida deixam de existir?
Mas ainda bem que fizeste as pazes com essa ideia.
É estranho, Gralha, mas eu não a sinto em lado nenhum. Não sei se é universal, provavelmente não, mas comigo é assim. Ela já não está. Nem por sinais, nem por orações. Ela se foi. Esteve aqui durante 50 anos e se foi. Segurei-a cá durante muitos anos, mas, em algum momento, ela escapou.
* E isso é bom.
Não estou a falar da memória, estou a falar da presença física, mesmo. Porque eu encaro a cena do "ai, se ela estivesse aqui" como necessidade da presença física. Até senti-la desesperadamente nos sítios em que ela gostava, para mim, é presença física. Dá para entender? Ando péssima com palavras :D E essas coisas nunca foram fáceis de explicar, mesmo.
O meu luto já terminou, mas integrei a imagem dela em tudo o que faço e em tudo o que sou! Falo dela ao meu filho, e tenho consciência da alegria que ela teria se cá estivesse, só de ver o neto crescer!
Para mim saber que já fiz o luto é ser capaz de falar dela com a maior das naturalidades...
Já com o meu pai, ainda não sou capaz... ainda me recuso a aceitar que ele não está cá... para isso ainda não estou propriamente pronta!
Mas nisto do luto, cada um faz da melhor maneira que consegue e não há fórmulas exactas!
"O meu luto já terminou, mas integrei a imagem dela em tudo o que faço e em tudo o que sou!" - é isso.
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