quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Isto não é um postal de Natal

Nunca fui um tipo desenrascado no que toca ao arranjo casual das avarias domésticas que, de tempos a tempos, amaldiçoam a casa dos Lyra de Carvalho. Coisas pequenas mas desesperantes para o Feng Shui familiar como uma persiana avariada, uma torneira que pinga, um pedaço de parede que cai ou um fusível que se funde num electrodoméstico qualquer.

É triste, mas não consigo resolver estes infortúnios pelas minhas próprias mãos e, de certa forma, a minha condição de macho ressente-se um bocado dessa incapacidade, especialmente na Melissa que, para infelicidade minha, tem um pai que sabe fazer tudo. E quando escrevo tudo é mesmo tudo. Estão a ver os estádios que têm sido erigidos pelo mundo para jogar futebol? Pronto, ele é um dos homens que normalmente mete o bedelho naquilo. Se houvesse uma competição entre mim e o meu sogro, o resultado seria, eu trocava uma torneira ele construía um país, com barragens, pontes e estradas a ligar cidades.
Por isso, disponho todos os anos dum budget anual estipulado para estas misérias no humilhante valor de 500 euros retirados do subsídio de Natal, isto porque não sou capaz de pedir à Melissa que pague a meias os arranjos que precisamos. Sou da opinião que deve de haver alguma dignidade na forma como se lida com as incapacidades genéticas (o meu pai também é como eu).

Mas o nascimento do Gabriel trouxe com ele, felizmente, alguma paz sobre este problema, fazendo-me mesmo esquecer que existe. Dos 7854 brinquedos de plástico made in china que se espalham pelas divisões do apartamento é frequente haver vários estragos a precisar duma mãozinha. O guizo do Noddy que deixa de badalar, as pilhas do avião dos Irmãos Koala que se gastam, uma roda do carro Faísca que salta, o telhado da quinta do Ruca que desaparece…enfim, problemas vários que desestabilizam a harmonia mundana da criança entristecendo a sua pobre alma e esbatendo-lhe a alegria de viver.

Felizmente que a vida dum catraio é a coisa mais simples do mundo e os problemas que o seu quotidiano gera enquadram-se na perfeição nas minha habilidades, estando eu sempre à altura de todas as dificuldades lúdicas do petiz. Posso-me orgulhar de, naquela casa, não existir nenhum carro sem pilhas (embora haja lá alguns que bem podiam ficar sem pio), nenhuma peça desencaixada nem tão pouco alguma luz fundida. Sabe bem vê-lo chegar-se perto de mim a estender-me um brinquedo qualquer para eu o ajustar com aquela certeza que o pai lhe vai resolver o problema em singelos segundos. Ele vê em mim um Bob o Construtor e isso aquece-me o raio do coração todos os dias.

No outro dia, percebendo que a casa ainda estava despida pela falta de árvore de Natal, vociferou o pedido. Fiz-me difícil, claro, que aquilo era muito complicado, exigia bastante esforço e que era uma tarefa que só os grandes e fortes conseguiam fazer, mas como ele fazia questão o pai fazia com muito gosto, mergulharia na tarefa com todo o prazer. Mandei-o buscar a chave de fendas, embora não precisasse dela para nada, e lá montei o arvoredo. O Gabriel exclamou um uau sentido quando liguei as luzes e aquilo ficou tudo para ali a piscar. Abençoadas luzes, compradas a 4,99 no chinês da Rebelva, mudavam de cor a cada dez segundos transformando o meu trabalho numa obra épica e maravilhosa.
A noite tinha tudo para ser perfeita não fosse a tradicional insensibilidade feminina que teima em não respeitar aquele momento sagrado de transição entre o Hugo pai e o Hugo marido.
-Já arranjaste o raio do botão do autoclismo que te pedi?! Porque é que tenho de te estar sempre a repetir as mesmas coisas?

5 comentários:

gralha disse...

Hugo, tudo isso e, ainda por cima, não sabes o que é um trench-coat? Temos homem! :) Melissa, levanta as mãos para o céu.

Melissa disse...

Levanto, mas levantava mais alto se ele soubesse mudar lâmpadas!

Supertatas disse...

o avião já ficava sem pilhas já

Sofia disse...

LOOOOOOOOOL
Lá em casa é contrário: as pilhas desaparecem "misteriosamente" ;)
Bjs

Juliana disse...

Maria Eduarda já tem talento para trabalhos manuais. Quando vejo ela já pegou a chave de fenda e abriu o brinquedo para consertar ( ou terminar logo de quebrar)! Deixo para ela, então, essa tarefa...