Adoraria poder escrever coisas bonitas sobre o paraíso, vida após a morte, sobre o nos reencontrarmos um dia noutra dimensão. Disseram-me muitas coisas assim e, se me confortaram num primeiro momento, de nada ou quase nada me serviram pelos meses adentro. Para gente que pertence a terra, como nós, adianta de muito pouco saber que há outro plano em que nos vamos encontrar. Queremos este plano, esta existência. Queremos o telemóvel, a gargalhada, a crítica sem pudor. Trocamos o momento real pela eternidade sem piscar o olho. Queremos o tempo anterior. Queremos o que nos pertence.
Perder a mãe é das experiências mais rouba-chão que vamos ter na nossa vida, seja em que idade for.
Para tudo. Tudo para. Na verdade, tudo muda, mas é como se tudo parasse.
O que posso dizer é que melhora. Melhora, sim. E as recaídas de dor, aquela dor surda que não tem jeito, vão sendo cada vez menos frequentes e as memórias da doença se vão esbatendo. O amargo da injustiça da perda também. Tudo vai seguindo em frente, inexoravelmente. E um dia, aquilo passa a ser um divisor de águas, uma baliza para tudo que era antes e tudo que veio depois, mas sem ser uma coisa negativa - é simplesmente diferente e poderoso à sua maneira.
E aí, se tiveres a sorte que eu tive, começas a acreditar em anjos da guarda.
6 comentários:
Texto 10*
Simples como só isto!
Adorei o post, Mel.
Deixo também um abraço apertadinho, com muito mimo.
...
:)
Nos últimos tempos tenho descoberto, quase cientificamente, que deus existe sim, há mesmo qualquer coisa. Curiosamente fui-me afastando mais da igreja, pelo que é(feita por homens, tão de carne e osso quanto eu), e fui ficando mais crente, muito mais crente.
Neste texto, acabaste por dar a volta e, podendo não adiantar de nada a quem está a sofrer a perda, a quente, no momento, explicaste muito bem todo o processo.
Beijo!
podendo não adiantar de nada a quem está a sofrer a perda, a quente, no momento -
é que não adianta mesmo nada, Vera. Mas, com o tempo, vamo-nos lembrando de quem esteve lá ao nosso mesmo quando não notámos, e é sempre reconfortante.
Brilhante descrição, Melissa. é isso sem tirar nem pôr ;)
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